NOTÍCIAS
10 DE NOVEMBRO DE 2021
Migalhas – Artigo – Ônus, gravames, encargos, restrições e limitações – Por Sérgio Jacomino e Nataly Cruz
Introdução
O objetivo deste opúsculo é oferecer uma base teórica para a construção de taxonomia dos elementos que compõem o conjunto informativo do Sistema Registral brasileiro, estruturando-os em classes e atributos para a configuração e especificação do SREI – Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis.
Algumas expressões frequentam a praxe cartorária no dia a dia da execução do mister registral – especialmente quando está em causa limitar, restringir ou modular este que é o direito real por antonomásia – a propriedade. O que significam, no âmbito do microssistema registral, expressões como gravames, ônus, limitações, restrições, encargos? Como estruturar o SREI partindo-se de expressões notoriamente plurívocas? Como qualificar os atos praticados no repositório eletrônico a ser criado? Como estabelecer um dicionário semântico que possa servir de base para a estruturação ontológica do sistema?
Há vários recortes possíveis para a estruturação do código. Alguns foram visitados pela POC-SREI na série de colóquios qualificados como ontologias registrais1. No âmbito do NEAR-lab (Laboratório do Núcleo de Estudos Avançados do Registro Eletrônico), vimos trabalhando a ideia de constituir uma malha semântica que possa estruturar e qualificar os elementos que integram e são consubstanciais às inscrições prediais.
É possível pensar na estrutura de dados que compõem o SREI como uma espécie de “grafo semântico” que interconecta os núcleos significativos do sistema – coisa, pessoas, instrumentos formais, direitos materiais, atos de inscrições etc. Falamos, então, no contexto do SREI, de ontologia objetiva, subjetiva, titular, legal-material (títulos em sentido material) e tabular.
Para que se viabilize a “ressemantização” das várias expressões que povoam a inscrições, buscando criar um vocabulário controlado dos atos, suas classes e atributos, é preciso uma rápida visita aos sentidos aninhados nas várias expressões acima aludidas, investigando o que têm de singular, e, ao final, sugerir uma “expressão-curinga” que possa servir de base para acolher as várias espécies sob um gênero bem estabelecido, determinado e controlado.
Gravames
A ocorrência da expressão gravame se encontra de modo esparso na legislação brasileira. Mais recentemente, todavia, constatamos uma extensão de seu significado, como veremos logo abaixo. Essa extrapolação dos sentidos tradicionais se dá na exata medida em que espocam os simulacros registrais, com seus “gravames” e “entidades registradoras” que ainda não ostentam um nome próprio.
Antes, porém, vamos conferir, num breve excurso, a origem da expressão e como ela se foi insinuando e acomodando nos textos legais.
Primeiramente, vamos verificar que a expressão provém do latim gravamen, que terá se originado da gwere, raiz protoindo-europeia significando “pesado” (heavy). No sítio Etymology online encontramos a seguinte definição:
“Trouble, physical inconvenience” (in Medieval Latin, “a grievance”), literally “a burden”, from Latin gravare “to burden, make heavy, weigh down; oppress”, from gravis “heavy”. [.] Specifically, in law, “part of the accusation which weighs most heavily against the accused”.
A ideia que a expressão originalmente trazia consigo é a de fardo, problema, inconveniência física, algo que inflige peso. Muitas expressões se formaram a partir deste étimo – por exemplo, agravar, pesar, afligir, gravidade…
O gravame era considerado, desde a legislação do Império, como uma infringência – nos casos de usurpação de jurisdição e de poder temporal, violência no exercício da jurisdição etc.2. Será interessante saber que a expressão possivelmente terá sido usada na legislação da primeira república no seu sentido lato de ofensa, afronta, agravo, injúria. Assim a encontramos nas consideranda do Decreto 212, de 22/2/1890. Neste interessante regulamento republicano, baixado por DEODORO DA FONSECA, visava-se desembaraçar a entrada e saída de pessoas no território nacional sem que fosse necessário portar um passaporte – uma “inutilidade vexatória”. Dizia o dito decreto que a exigência legal do passaporte, além de estar em manifesta oposição a um regime de completa liberdade individual, é, também um “gravame imposto ao emigrante”. O dito decreto seria revogado somente em 1991.
De um ponto de vista mais estrito, porém, gravame é todo ônus que recai sobre direitos, restringindo o seu pleno exercício, gozo ou fruição. Diz-se, amiúde, que o gravame é um encargo, um ônus. No âmbito do processo civil, indica atos jurisdicionais constritivos, decorrentes de decisões judiciais (p. ex. § 1º dos artigos 791, inc. IV do 848, inc. V do 889, do § 2º do 901 etc. todos do CPC).
Mais recentemente, contudo, o jurista se depara com uma extensão de significados, com o sentido aberto, espécie de “curinga”, à falta de nome próprio. A expressão evoca formas atípicas de restrição – como, por exemplo, nos exemplos encontradiços na redação dada aos arts. 26 e 26-A da Lei 12.810/2013 (Lei 13.476/17). Os ditos “gravames”, neste contexto, são restrições que incidem sobre ativos financeiros e valores mobiliários (art. 63-A da Lei nº 10.931/2004 e Decreto 7.897/13).
Para acolher as novas modalidades de restrições aos direitos, criou-se um registro especial de ônus e gravames de ativos financeiros e valores mobiliários, regulamentado pelo Banco Central do Brasil, concebido especialmente para fins de “publicidade e eficácia” em face de terceiros (art. 26 da Lei 12.810/13). São as chamadas “entidades registradoras” que vicejam a latere do sistema registral3.
Clique aqui para conferir a íntegra do artigo.
Sérgio Jacomino: Quinto Oficial de Registro de Imóveis da Capital de São Paulo. Presidente do NEAR – Núcleo de Estudos Avançados do SREI. Ex-presidente do Instituto de Registro Imobiliário do Brasil (IRIB) nos anos 2002/2004, 2005/2006, 2017/2018 e 2019/2020. Doutor em Direito Civil pela UNESP (2005) e especialista em Direito Registral Imobiliário pela Universidade de Córdoba, Espanha. Membro honorário do CeNoR – Centro de Estudos Notariais e Registais da Universidade de Coimbra.
Nataly Cruz: Membro do NEAR – Núcleo de Estudos Avançados do SREI.
Fonte: Migalhas
Outras Notícias
Anoreg RS
02 DE SETEMBRO DE 2024
STF vai decidir se união estável pode ser convertida retroativamente em casamento
Tese a ser firmada será aplicada a todos os casos semelhantes no país.
Anoreg RS
02 DE SETEMBRO DE 2024
Rádio Justiça: debate sobre inventário extrajudicial é um dos destaques desta segunda-feira (2)
No programa Regra do Jogo, confira entrevista sobre as normas dos esportes paraolímpicos.
Anoreg RS
02 DE SETEMBRO DE 2024
Resolução nº 571/24 autoriza inventários, partilhas, divórcios e separações em Tabelionatos de Notas mesmo com herdeiro menor ou incapaz
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) publicou a Resolução nº 571/24, que disciplina a lavratura dos atos...
Anoreg RS
30 DE AGOSTO DE 2024
Em palestra, João Pedro Lamana Paiva destaca inovações na alienação fiduciária e hipoteca durante a Cidade da Advocacia 2024
João Pedro Lamana Paiva, membro do Conselho Deliberativo da Anoreg/RS, participou como palestrante do evento Cidade...
Anoreg RS
30 DE AGOSTO DE 2024
Parcela Express traz inovações do mercado de pagamentos aos Cartórios de Notas
Mais que um gateway de pagamento, a especialista em tecnologia financeira para cartórios oferece soluções que...